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27.7.04

Repto ao sr. Cayatte 

Sugeriram-me que escrevesse sobre o Centro Português de Design (CPD), sobre Henrique Cayatte e sobre o facto de este vir a presidir o mesmo CPD. Respondi que era díficil falar sobre o CPD, dada a presente situação e que sobre o designer já tinha elaborado um texto a que dei o título Foi um prazer fazer negócio consigo, muito embora acredite que poucos o tenham compreendido.
Entendo que a ansiedade seja enorme. A discussão entre os designers atinge níveis gradualmente perturbantes e inclusivé desrespeitosos na Internet. Poucos são prestigiados, mais que muitos não são; as oportunidades são poucas, muitos designers experienciam o desemprego ou a forçosa transferência para áreas onde não são especializados; apenas se ouve falar em design de 2 em 2 anos quando o jet-set decide tomar uns copos nos locais fashion de Lisboa (isto a continuar seria demasiado prolongado...). O contexto em que Henrique Cayatte assume a presidência do CPD não é fácil. Mas sobre esta relação nada se poderá dizer agora; quando um tempo significativo passar e houver um corpo de trabalho sobre o qual formular um comentário, aí será possível analisar este acontecimento.
Apraz-me por isso prolongar as anotações anteriores sobre a presença do designer Henrique Cayatte no panorama nacional. Falar sobre ele é aliás irremediável, mesmo neste blog.
No último texto referia-o entrelinhas como sendo a pesonificação de uma marca, comerciável e negociável, de prestação de serviços. Mas suprimindo as observações redundantes creio existir um percurso ponderado e extremamente objectivo.
A presença em determinados momentos/objectos estratégicos colocaram-no num nível de determinado misticismo; a sua envolvência cultural favoreceu-o em parcerias e conhecimentos que sublinham hoje a sua importância como sendo um designer (o único?) a ter peso de discurso e/ou decisão fora do próprio âmbito do design. Esta posição deve-se mais ao discurso verbal (qual Pedro Cabrita Reis) que a qualquer projecto gráfico ou visual, dos quais a maioria não retirará nenhuma posição intelectual, social ou política. Que outro modo se poderia considerar a tamanha importância de alguém cujo trabalho acaba por ser o mais convencional de todos? Os seus trabalhos são aliás atravessados por uma perversa neutralidade que nos encanta, razão de uma invisibilidade da sua presença, que nada de novo proporciona e que até enfastia o mais atento dos colegas de profissão. Mas estes projectos não são realizados para os colegas mas sim para uma comunidade que (ainda, esperemos) não entende o verdadeiro propósito da profissão de designer. Ele conhece-a e descobriu-a do modo mais sério e mágico possível.
Tal como acontece com Bruce Mau, Cayatte é um óptimo designer, inteligente, mas não consegue ser apontado como notável ou impressionante, a não ser pelos seus clientes, que numa visão mais estreita da disciplina do projecto e o que ela pode fazer, se deixam convencer.
Cayatte é falado, invejado, entrevistado, escutado, lido. É possível pensarmos que este posicionamento individual seja absolutamente acidental, mas não parece provável. Na minha opinião é calculado e seria insultuoso pensarmos que não.
Este o seu grande feito: a obtenção de poder. Poder de argumentação, persuasão, influência, sobre os colegas, sobre os amigos, sobre os alunos, sobre os clientes.
Resta saber se agora, na presidência do CPD vai partilhar isso connosco.

22.7.04

Style = Fart 

Andamos todos atarefados com a criatividade. Precisamos de criar uma brochura para um cliente, precisamos de criar um logotipo para outro, criamos ilustrações e fotografias nos tempos livres e ainda pretendemos criar qualquer coisa, que não sabemos muito bem o que é, mas que temos eventualmente de criar.
Estamos de tal modo concentrados nesta imposição que nos parece garantido que somos de facto criativos; aliás, nós somos os "criativos". A tal ponto que nos concedemos o luxo (há quem lhe chame desígnio) de criar por criar, o que por sua vez significa, fazer por fazer. Esta criatividade assim preconizada, na era informática, é rápida, limpa, bonita, mas corre muitas vezes o risco de se tornar, também rapidamente, oca, banal, inútil e desprovida de objectivo. Para onde vai tanta criatividade? Porque desaparece ela? E porque foi iniciada segundo essa mesma condição?
O que falta relembrar aos designers é que a criatividade não é apanágio da nossa profissão, mas sim uma possibilidade utilizada e ao alcance de todos. Bastaria, segundo os termos do "criar por criar", observar quem hoje em dia pratica (ou julga praticar - uma outra questão) design para poder concluir isto mesmo. Mas não me refiro a isso. É à utilização corrente, diária e sistemática da criatividade (a real) em tudo o que é actividade humana. Curioso verificar que em nenhuma outra área se cria "por criar", mas inclui-se sim a noção numa prática de modo a favorece-la.
Não são poucos os designers que, em todo o mundo, consideram que criar é obter um nível gráfico individual suficiente, a partir do qual se impõem e se expressam, vulgarmente designado por "estilo". Tantas horas a trabalhar para descobrir um toque exclusivo, intransmíssivel, numa aproximação ao genial; tudo para que finalmente o mundo saiba quem é e como trabalha. Os objectos são agora projectados na medida em que têm a dádiva da sua criação e são reconhecidos por isso. Toda essa criação tem como objectivo atingir uma identificação pessoal, a conquista de uma "assinatura" ou "carimbo" e que permite-nos reconhecer o designer de determinado projecto.
Apela-me referir como exemplo o cartaz de Stefan Sagmeister para a Cranbrook Academy of Art e para a AIGA Detroit de 1999, onde no seu próprio corpo infligia no abdómen a frase «Style = Fart», que em português se torna «Estilo = Peido»; curiosamente os anglo-saxónicos têm um outro significado para a palavra fart: «stop wasting time not doing very much», o que para esta discussão me parece indiferente.
O que julgo ser de salientar é que anda muita gente a utilizar a mensagem do cliente para fazer passar a sua própria urgência de comunicação e que apesar de se convencer que trabalha, que cria, que é original, não tem andado afinal a fazer grande coisa.

12.7.04

Exmo. Sr. Professor 

Catedrático, associado, auxiliar, com ou sem agregação, adjunto, assistente, equiparado ou não, a si me dirijo na convicção de que V. Ex.ª tomará por certo a atenção devida e que julgo ser necessária para o tema que humildemente exponho. Sabe V. Ex.ª que o Ensino Superior é a garantia fundamental da educação nacional; sem diferenciar entre Público e Privado ou entre Universitário e Politécnico, nele reside a esperança de um país, dele depende o desenvolvimento nos mais diversos níveis da sociedade portuguesa. Sabe também V. Ex.ª que é necessário e até indispensável dotá-lo das mais completas e seguras características possíveis.
Decerto reconhecerá V. Ex.ª que para cumprir tais objectivos e porque é de ensino que falamos, é incontornável escolher os melhores professores, ou seja, dos candidatos à disposição, preferir os que melhor prestação poderão dar. Baseando esta escolha na posição actual que ocupam, na compreensão académica e na posse de experiência comprovada.
Em Design o terreno é escorregadio, compreendemos. O que se ensina em Design? Uma teoria e uma prática - certo -, mas o que não podemos duvidar é que acima de tudo o design é uma realidade e que para transmitir um domínio e um conhecimento dessa mesma realidade torna-se fundamental a experiência.
Detesto, em certas ocasiões, pôr o dedo na ferida. Sobretudo nesta, pelo melindroso que é tão somente referi-la enquanto problema, em especial se tivermos consciência que a maior parte deste assunto se passa num plano de secretismo, afastado do conhecimento de um leque minimamente alargado. As decisões de contratação de docentes para o Ensino Superior são tomadas não se sabe muito bem por quem; mesmo quando temos a informação do júri, desconhecemos por completo que pressões existem, quem realmente escolhe, quem classifica, quem propõe, por que razões.
Tendenciosamente têm-se escolhido aqueles que como proposta, pretendem vir a ser (conhecedores, capazes, informados, críticos, activos) mais do que serem-no já. Os níveis de eficiência devem à partida ser antecipados pelo grau de conhecimento e experiência que cada um tem. Se vamos contratar alguém para dar aulas, que para além de nenhuma ou pouca experiência na matéria nem sequer tem prática na profissão, para quê contratar de todo? É o que tem acontecido um pouco por toda a parte, foi o Sr. Dias na FAUTL, a Srª. Vieira da Silva e a Srª. Rodrigues na FBAUL, o Sr. Brandão na ARCO, o Sr. Baptista na ESAD/IPL, uns quantos no IADE e o Sr. Ferreira na ESTAL. A lista até continuava...
Em concursos públicos até já há uma preferência por alguém com experiência em docência, como que esta qualidade fosse requisito sine qua non para provar a necessária competência para o cargo. Em certos locais metade do pessoal docente nunca tinha sido professor; a maior parte, o que é pior, nem nunca foi designer, apenas estudou; esta não é a volta a dar ao problema.
Os cursos não estão a ter o efeito desejado ou desejável, a formação final não é a esperada e muito menos a exigida. Os alunos mais atentos e preparados estão descontentes, manifestam-se aqui e ali contra uma prática de ensino estática, relaxada, despreocupada. Não são raros os casos em que os próprios alunos têm um nível de informação e conhecimento (já para não falar na prática) superior a uma grande parte de assistentes, estagiários ou não.
Exmo. Professor, queremos acreditar que não leva uma vida boémia e que anda a tentar resolver estas questões quando não está nas aulas, mas torna-se difícil.

5.7.04

Duas frases, duas perguntas 

Não é apetência comum em mim elogiar trabalhos de publicidade. Aliás, basta-me lembrar os atropelos e infracções às regras de trabalho para rapidamente desdenhar deste universo. Mas quando o exemplo serve os meus propósitos, é díficil recusar tamanha proposta.
O último anúncio da Optimus (e que mais publicidade se tem visto em Portugal nos últimos anos, senão de operadores de telemóveis?) apresenta-nos uma situação com a qual é impossível não simpatizar. O filme é bem conseguido e transmite precisamente o que as mentes do marketing e da comunicação pretendiam: o poder da nova geração. Já antes a TMN tinha lançado na campanha I9, uma mostra das vantagens, situações, possibilidades, desta nova tecnologia. Porque é disso que se trata, esta é uma nova tecnologia, repleta de potencialidades. Mas não se torna vísivel nas campanhas destes operadores qualquer referência a essa mesma tecnologia. Julgo que não só porque seria complicado demonstrar, como também não interessa verdadeiramente ao público. O que este pretende saber, hoje, são as vantagens, as diferenças, as novidades e o impacto que o produto terá nele. Nada melhor para demonstrá-lo do que aludir às suas emoções, alternando com uma subtil exposição das suas potencialidades. No fundo, quem comunica não pretende exibir a sua tecnologia, elucidar ou vanglorizar sobre ela. Essa fase da comunicação já passou.
Portugal necessita de comunicadores, com objectivos, com intenções, alguma clarividência e de preferência com um conjunto de conhecimentos que os tornem capazes, não só de preencher o mercado nacional, como de sobre ele proporcionarem uma qualidade que nos aproxime do melhor que se vai fazendo em termos internacionais.
Há por aí muito atelier a iniciar uma prestação de serviços em design, a maioria dos quais não sabe comunicar o seu propósito, menos comunicar ao cliente a evidência dos seus serviços e a possibilidade dos projectos.
A capacidade de conhecimentos é, para mim, um género de súmula da nossa experiência. Aprende-se com vários exemplos e que não sejam apenas os nossos erros a servirem-nos de lição, mas o que se testemunha é a incursão dos eventos passados sobre o nosso presente, de modo indissociável.
Muitos são os locais que empregam designers com a convicção de que os vão formar finalmente, numa espécie de escárnio em relação à Escola onde o indivíduo se formou. Talvez não seja óbvio, mas para aprender vai-se à escola, para trabalhar vai-se para o emprego. Que a experiência e o conhecimento aumentem, nota-se; mas considerar agências ou ateliers em Portugal uma "escola" é desprovido de razão. Por muito será o local para onde se vai quando se falta a essa mesma "escola".
Mas dada a falta de verdadeiros comunicadores e das explicações empíricas para quê NASCEr DE NOVO? Para quê FAZer UM CURSO NA ETIC?

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