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20.1.05

Standardização 

Sempre desconfiei dos que assumem que o design não é arte. Encobertos pela disponibilização dos seus serviços, alguns lá se vão convencendo que o que fazem é simplesmente economia, comércio, adequação de vontades, cumprimento de pedidos, respeito pelos budgets, deadlines, know-how, targets, mock-ups... Para mim esta descrição de vendedor compõe a figura do designer incompetente, aquele que não tendo visão, compreensão e capacidade para gerar e criar novos objectos visuais, decide refugiar-se no seguro caminho das catalogações, estereótipos, templates e demais reduções da prática, do processo e do tempo.
Design não é arte por não ser pintura ou escultura ou instalação? O designer não pode (ou não deve?) criar por si próprio, devido à imposição de uma encomenda, à presença de um cliente, necessitando obrigatoriamente de objectividade? Mas então e as encomendas feitas a artistas, muitas das vezes com o tema e o estilo já escolhido? Ou mesmo projectos transversais apresentados hoje, inclusivé em Portugal e que são mais pensados pelos comissários do que pelos próprios artistas? Não haverá espaço para a utilidade na arte?
Seja qual for a posição assumida e a escolha profissional de cada um, no mínimo a presença da arte no design é algo indubitável. O que muitas das vezes os aficcionados do comércio, das vendas, do marketing se esquecem, é que a génese da actividade encontra-se precisamente na integração da arte na indústria. É o papel inicial do artista no controlo do processo e resultado industrial que determina a existência de uma prática actual.
Hoje, a arte no design sofre um retrocesso. Se no ínicio o propósito era colocar a Arte à disposição do trabalho efectuado pela máquina, e portanto próximo de um público mais generalizado e não elitista, agora absorve a tecnologia e molda-se a ela. Uma consequência ou ramificação decadente deste entendimento é a standardização dos objectos. Neste sentido, os produtos da indústria fazem-se como se supõe ou como se impõe,seguindo exemplos e modelos, regras cuja criação se desconhece mas circulam e cujos benefícios são mal previstos. Aqui a arte não serve nenhum propósito, ela é antes decoro e elemento de uma fórmula.
Feita a análise ou observação dos objectos pertencentes à nossa cultura material, sobra pouco de artístico neles, pois é gradual a diminuição do papel intelectual e criador do designer, em deterimento de uma suposta segurança comercial - ideia abstracta e nunca devidamente fundamentada. É inconcebível que a colocação dos títulos centrados se venda melhor do que alinhados à esquerda, que com uma sombra este seja mais apelativo, que se for maior no tamanho é também em legibilidade. Conclusões retiradas de um mercado constituído por quem acha sempre qualquer coisa sobre todo o assunto e nunca se baseia em estudos ou apreciações objectivas e científicas.
Esta standardização é então uma "pedra no sapato" na medida em que inibe o desenvolvimento e a fertilização de ideias, a germinação de novas opções, o elemento de surpresa e por isso mesmo, a capacidade económica e a regeneração industrial. Transforma também qualquer nova situação e aproximação ao solucionar de problemas como exclusiva alimentação das elites, rotulável e por vezes "desprezada".
Alimenta inclusivé a certeza de uma população que se pensa evoluída, em considerar opiniões do foro estético e subjectivo, quando na realidade se encontra a anos-luz de produzir um corpo de conhecimento ou emissão de opinião pertinente, actualizada e considerável sobre qualquer objecto em questão.

9.1.05

«Think more, design less.» 

É o que Ellen Lupton costuma dizer aos seus alunos no Maryland Institute College of Art em Baltimore, Estados Unidos. Pretende com isto que sigam ideias e conceitos próprios, não optando por orientar os seus projectos pelo estilo ou pela tecnologia. Num contexto onde a proliferação de objectos e do próprio serviço é já considerado excessivo, surge com naturalidade este apelo a uma reflexão, à consideração de um processo que se deve pautar sobretudo pela pertinência e pela presença de objectivos simples. A utilização de ferramentas digitais proporciona uma conclusão apressada, a de que a extensão dos projectos pode ser encurtada, levando inevitavelmente em vários locais à supressão do tempo de gerar ideias, o mais necessário de todos. É claro que se David Carson tivesse seguido o conselho nunca se teria destacado como um designer intuitivo e de uma capacidade infindável de produção.
Mas a frase transporta mais significado do que este. Para além de se tornar importante para a aproximação e compreensão que fazemos do processo, seja ele o praticado no ambiente académico ou no local de trabalho, mal não faria se afastando do seu objectivo pedagógico, a contextualizássemos no método profissional da actividade.
Prepassa-me uma sensação que, concentrado mental e temporalmente no seu projecto, falte ao designer, por vezes, a noção de como orientar o seu trajecto profissional. O que acontece em demasia, provocado não apenas por esta aventura tecnológica, mas acima de tudo porque o designer não "conduz" o seu processo de trabalho; ele é antes, "conduzido", permitindo que a sucessão de acontecimentos o responsabilize directamente, sem que tal seja feito de modo auto-consciente.
O melhor exemplo que temos será o dos concursos. Em Portugal, na área do design gráfico, são raros os objectos visuais que são criados sem ser por concurso. Seja o convite público ou restrito, as demais entidades pedem ante-projectos com a mesma arrogância e surrealidade que entrar num restaurante e pedir n pratos para escolher o que mais apraz.
Vamos supor que estes concursos são transparentes (que não são), organizados por entidades que sabem o que querem (que não sabem), que respeitam os designers a quem se dirigem (que não respeitam) e que não irão, de modo algum, escamotear as regras morais e profissionais (que escamoteiam). Vamos supor tudo isto para reduzir o escopo da mensagem que aqui se tenta passar.
Um "profissional" só o é quando pratica uma profissão, ou seja, faz de uma actividade o seu dia-a-dia e depende financeiramente dela; não se confunda profissionalismo com competência, por muito rigorosos que sejam os designer por cá, a verdade é que existe uma larga quantidade que é semi-profissional, quando aceita participar nestes concursos. A maioria sabe que não vai ser escolhida, seja por razões de gosto, de favorecimentos ou outros e que estes concursos não cobrem as despesas e honorários das propostas não seleccionadas; o que equivale a uma parcela, por vezes considerável, de trabalho não remunerado.
Costuma-se dizer que tempo é dinheiro, só os designers não sabem ou não se lembram disso, preferem dispender tempo em projectos que não se vão cumprir do que em cimentar uma relação mais esclarecedora com a comunidade.
O segredo da actividade está em dois pressupostos colectivos e generalizados: atitude e confiança. Marcar uma posição determinante, no que diz respeito aos métodos de trabalhos que proliferam no mercado e elaborar uma estratégia que ganhe a confiaça da sociedade, seja pela educação, seja pelo explicitar das vantagens inerentes à actividade.
Ora um designer que não queira tornar a sua posição na sociedade melhor e que não queira trabalhar no sentido de esclarecer aqueles que serve, não estará a pensar muito.

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