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23.12.04

Dediquemo-nos ao ensino 

É susceptível de criar dúvida, qual a direcção de algum ensino superior nacional em matéria de design. É razoável por uma questão de localização e não apenas pela escolha dos futuros frequentadores destes cursos. É causa de indecisão inicial e de incerteza considerável nos locais de trabalho. São os ex-alunos criadores/pensadores ou técnicos qualificados?
O modo como se inserem no tecido empresarial deriva significativamente do processo da sua formação; ou antes, devia. Daí que seja justificada a substituição da pergunta anterior pela de saber se os cursos superiores de design devem preparar os alunos para o mercado de trabalho ou para a nobre tarefa de "ensinar"? Ou se faz o esforço de compreensão do que é o mercado de trabalho, actualmente e num futuro próximo, ou se organiza e estrutura as matérias constituintes da disciplina.
Há uma firme convicção da parte de algumas instituições, que estas devem disponibilizar um género de ensino que de algum modo apresente perspectivas positivas sobre o futuro profissional individual. Afinal, a educação parece fazer parte de um plano integrado de desenvolvimento em que é urgente suprir as nessidades do mercado e da indústria e por conseguinte, dotar o mundo laboral de competências técnicas e de jovens capazes e competentes. É como se cada instituição elabora-se uma estratégia de marketing antevendo a forte concorrência. Torna-se obrigatório mostrar resultados, práticos e profissionais, nem que seja a algum custo.
Mas falando em marketing, quem frequenta afinal esses mesmos cursos, quem justifica a sua existência e quem, em ultima análise, a providencia? A quem deve ser dirigido o discurso desses cursos e de que modo deve ser orientado? O manual dirá que deve agradar o potencial público-consumidor, neste caso frequentador.
Numa das últimas estatísticas do Icograda perguntava-se: «Should graduate design programmes focus on redefining Graphic Design, or producing students tailor made for industry?», ou seja, deverão os cursos ser orientados para a definição ou redefinição da disciplina e da actividade ou estar preocupados em formar alunos adaptáveis à indústria? E se 48% respondeu ambas (uma resposta claramente confusa e pouco elucidativa, considerando os recursos da maioria das instiutições, sobretudo a nível de recursos humanos), 47% prefere a primeira opção, havendo apenas 9% a quererem sair "engomados" para o mercado.
Que seja eu a dizê-lo, alguns poderão não atribuir importância, mas quando se trata de uma sensação geral, é uma clara falta de informação dos responsáveis pelos próprios cursos.
Haverá, seguindo esta vontade, um colapso da indústria? Julgo que não. Perderiam certas instituições em prosseguir este plano e necessidade (porque não afirmá-lo)? Julgo que não. Teria que haver um novo levantamento de competências, qualidades, discurso, debate? Certamente que sim. Teriam que se realizar mais eventos, mover mais pessoas, mais recursos? Certamente que sim. Mas acredite-se ou não, este não parece ser um "receio". Em Portugal, estamos a passar ao lado daquilo que é a direcção da restante Europa, não por falta de recursos ou demais preocupações correntes em outras áreas, mas por pura escolha.
Não deixa de ser algo descrente, contudo, a inoperatividade da primeira ideia. Pois se é previsto dispor um curso para o "mercado" de trabalho, não deveria haver estágios profissionais inseridos? Não haveria convidados frequentes apresentando resultados de trabalho? Não haveria programas de inserção em ateliers, agências, empresas? Não teriam os professores que saber o que se passa na actualidade e portanto serem eles parte integrante desse "mercado"? E que ideias têm então os responsáveis sobre como adaptar uma estrutura curricular às ditas urgências da indústria? Incluir formação na área informática e ceder que a sua melhor hipótese é incluir o ensino de Flash, 3D Studio, Dreamweaver em cursos que à partida não estão relacionados a estas tecnologias? Não será essa a tarefa de escolas de ensino tecnológico, permitindo assim diferenciar as propostas de ensino e permitindo ao potencial aluno a escolha de uma ou outra?
Ensinar não deve invalidar a observação da prática profissional fora dos círculos académicos, mas dirigir um Bacharelato ou uma Licenciatura com base numa concepção abstracta e desprezar, dentro da herança projectual, as hipóteses de renovação é introduzir descrédito quando um programa se quer competitivo.
A própria designação de "mercado" de trabalho torna-se incompreensível; esta é antes, seguramente, uma ideia, uma noção, extremamente abstratizada da situação. Dificilmente alguém conseguirá definir sem descurar a sua amplitude e complexidade. A isto acresce o facto de ser frequente o seu uso por parte de docentes que não participam dele enquanto designers.
A recusa torna-se teimosia.
E se já quem frequentava os cursos reinvindicava a mudança, a verdade é que não só algumas partes do processo de ensino, como inclusivé o próprio "mercado" o começam a fazer. Os sinais estão por toda a parte.

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