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30.11.04

País-disparate 

Em Massive Change, publicado recentemente, Bruce Mau inicia com «For most of us, design is invisible. Until it fails.»; a percepção deste fenómeno consubstancia um impulso na construção de soluções optimizadas para uma determinada realidade. O nível de atenção sugere que design é pensar sobre a vida e que mesmo ao compreender que a actividade se destina à elaboração de invisibilidades, que sustentam a própria vida, ela é indispensável pois a sua ausência causa desequilíbrios. É também indicador que mais do que escolher um tipo de letra, mais do que decidir uma cor, mais do que escolher papéis, design é absorver o quotidiano, as questões, as verdadeiras necessidades; sobre elas reflectir e indagar soluções positivas. Será portanto um disparate, perante a constatação da falha, não agir sobre ela.
Há quem discorde, defendendo-se com um suposto e miserável pragmatismo, co-relacionado com o tempo dispendido sobre um único projecto; algo que se tornou objectivo de recorde por estas terras. Estranho que assim seja, devido aos inúmeros exemplos disponíveis pelo mundo fora, de aproximações diametralmente opostas mas que contudo apresentam vantagens irrefutáveis.
Em False Flat, Why Dutch Design is so good, duas das primeiras páginas apresentam um mapa-mundo, onde todos os países estão desenhados com um contorno preto sobre o fundo branco. Todos menos a Holanda, que ocupa neste plano um tamanho insignificante. Tão insignificante que é quase heróico como realmente consegue ter uma tão larga qualidade de projectos de design e nomes importantes como Irma Boom, Droog Design, MVRDV, Rem Koolhaas, Marcel Wanders, jop van Bennekom ou Experimental Jetset. O livro explicará o resto.
A comparação com Portugal, para mim é inevitável, pois é a única que me interessa. É possível argumentar na diferença para com outras nações, por exemplo os Estados Unidos, que embora superiores em muitos aspectos, não parecem prontos a "liderar" neste; será portanto uma diferença mais grave. Mas esta noção não nos pode escudar ao conhecimento que temos dos dados e sobre eles efectuar uma análise, que provoque uma consciência em relação ao que fazemos dispondo lado a lado ambas as realidades. Não será na observação que reside a chave para o nosso desenvolvimento? É para mim lógico, que qualquer país (com a possível excepção de dois ou três) seja diminuido em relação à Holanda, mas liberta-nos isso da nossa responsabilidade e remete-nos obrigatoriamente para uma desconcertante apatia? Uma espécie de conforto português: "Deixa os outros, nós cá tratamos dos nossos..."
Querem-me convencer que nos devemos adaptar ao mercado nacional, ou seja que somos em certa medida forçados a trabalhar mediante as circunstâncias impostas por um largo grupo de indíviduos.
Em Portugal a educação visual aparece tarde nos curriculos e é remetida para um papel secundário da aprendizagem, a maioria da população vive a sua inércia pessoal, deixando os museus vazios, tal como as exposições e demais acontecimentos relacionados com a comunicação visual. Após um período de limitação imagética antes do 25 de Abril, a nossa jovem democracia tem mostrado uma fraca aposta na produção cultural e os meios mais abrangentes, sobretudo a televisão, têm conduzido ao desastre os hábitos de captação de imagens. Coincidentemente, o poder da marca e o marketing impõem estratégias ao design que o forçam a entrar numa homogeneização em vez de percorrer percursos cada vez mais distintos. O dito "mercado" que será reflexo natural deste contexto, espelha não só a desvalorização da qualidade ou de uma simples e manifesta vontade de superação, mas também dá mostras de não saber lidar com a quantidade. A larga percentagem de trabalho feito provém de opiniões não fundamentadas de clientes presunçosos, desrespeitadores e pouco inteligentes que desconhecem profundamente o propósito ou a origem desta actividade, onde por vezes são acompanhados pelos próprios profissionais que se sentam ao seu lado e acarretam ordens. E querem-me convencer que nos devemos adaptar ao mercado e produzir objectos para estas circunstâncias em vez de iniciarmos uma modificação que não só prove a nossa qualificação mas como também a nossa capacidade colectiva de auto-superação. Essa é boa...

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